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grupos naturais

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Grupos Naturais na Sistemática Filogenética

A sistemática pretende entender e descrever a ordem que existe no aparente caos da biodiversidade. No seu esforço, a sistemática pretende trabalhar com grupos naturais, porém, não existe definição consensual do que sejam grupos naturais. Veremos que os grupos naturais reconhecidos pela sistemática filogenética estão de acordo com a definição de Hull (em Wiley, 2011), segundo o qual, grupos naturais seriam aqueles produzidos pela ação de alguma lei natural. 

A sistemática filogenética busca entender e descrever a ordem na biodiversidade, baseando-se no entendimento de Darwin, segundo quem esta organização seria hierárquica e estabelecida pela filogenia (genealogia das espécies, nas palavras dele) (veja mais sobre isto aqui). Assim, a sistemática filogenética sei preocupa em descobrir e descrever as relações, que seriam reais e naturais, entre grupos de organismos que também se supõe terem existência real na natureza - espécies e clados*, que podem ser considerados naturais, de acordo com a definição acima, porque são produtos do desenrolar da evolução, que é um processo natural.

A sistemática filogenética, então, reconhece dois tipos de grupos naturais, que podem ser distinguidos pelo tipo de relação existente entre seus elementos constituintes. Os elementos que constituem os clados são as espécies, e as espécies de um clado são associadas de acordo com suas relações filogenéticas, ou seja, as relações estabelecidas pelo compartilhamento de espécies ancestrais mais ou menos próximas. Essas relações, normalmente, são hierárquicas (exceto quando ocorre a evolução reticulada, com a formação de espécies híbridas). Por outro lado, os elementos que constituem as espécies são os indivíduos, e os indivíduos de uma espécie são associados de acordo com relações tocogenéticas, ou seja, as relações reprodutivas entre entre eles. As relações tocogenéticas, normalmente, são reticuladas* (a exceção são as relações entre indivíduos de espécies assexuadas, que são hierárquicas). A distinção entre relações filogenéticas e tocogenéticas e a associação entre elas na composição da ordem natural dos seres vivos são mostradas na Figura 1.

figura 1 - Relações filogenéticas e tocogenéticas

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Relações  filogenéticas entre  espécies (à esquerda) e relações tocogenéticas entre indivíduos de cada espécie (à direita), no momento de um evento de especiação (cladogênese). O triângulo cinza ou hachureado nas figuras indica o momento da cladogênese. Na figura à direita, os pontos negros são machos; brancos são fêmeas. (Modificado de Hennig, 1966).

clados

 

Como explicam Wiley & Lieberman (2011), dentre os três tipos possíveis de grupos de espécies (monofiléticos, parafiléticos e polifiléticos), apenas um - os grupos monofiléticos (clados) - podem ser considerados naturais, já que, este é o único deles cuja existência pode ser prevista a partir de uma lei natural, no caso a teoria da evolução. Grupos monofiléticos se originam de um processo evolutivo chamado especiação e reúnem uma espécie ancestral e todas as suas espécies descendentes; são constituídos, portanto, de espécies que compartilham um ancestral comum exclusivo. Por outro lado, grupos polifiléticos e parafiléticos são criações dos taxonomistas; eles não possuem realidade na natureza – nenhum processo natural conhecido produz tais grupos.

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espécies

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As espécies são entidades importantes dentro da sistemática. Primeiramente, porque uma das tarefas do taxonomista é exatamente a estimativa da riqueza em espécies do planeta. Além disto, as espécies são a unidade básica da taxonomia, todos os táxons definidos em nossas classificações são espécies ou grupos de espécies. Delimitá-las apropriadamente, portanto, é um passo importante do trabalho do sistemata/taxonomista: diferentes entendimentos sobre o que sejam espécies podem levar a classificações distintas e a estimativas diferentes da biodiversidade.

É preciso ter em mente que o termo espécie tem duas conotações, nem sempre convenientemente distinguidas: uma espécie é uma entidade, um conjunto natural de organismos, isolada de alguma forma de outras entidades equivalentes. Por outro lado, espécie é, também, o nome dado a uma das categorias dentro da hierarquia lineana de classificação. O taxonomista procura fazer com que os grupos a que se atribui o nível de espécie na classificação coincidam com os grupos naturais a que chamamos espécies, o que nem sempre é tão simples quanto pode parecer.

Com o advento da teoria da evolução e o entendimento das propriedades dinâmicas das espécies na natureza, a definição do que sejam espécies e a forma como elas podem ou devem ser reconhecidas tornaram-se o foco de importantes discussões. Uma das consequências desse debate foi a formulação de inúmeros conceitos de espécie.  Em especial, tem sido difícil formular um conceito que seja aplicável a todos os tipos de organismos. 

Wiley & Lieberman (2011), nos quais a discussão abaixo se baseia em grande parte, reconheceram três formas básicas de se considerar a natureza das espécies: como classes ou tipos (kinds), como conjuntos (sets) ou como indivíduos.

Espécies como classes: Classes agrupam indivíduos que compartilham determinadas características. Se um indivíduo possui este conjunto de características, então ele pertence àquela classe. Poderíamos considerar, ainda, classes naturais (quando derivadas de processos previstos em uma teoria científica considerada válida) ou classes nominais (simples nomes associados a definições que não derivam de teorias científicas). Wiley & Lieberman (2011) apresentam como exemplo de classe natural o elemento químico 'hélio'. Todo e qualquer átomo que contenha dois prótons é um átomo de hélio, independente de como e onde ele tenha se originado (por exemplo: por fissão ou fusão de outros átomos; no sistema solar ou em qualquer outra parte do universo). A definição da classe hélio deriva das teorias de física atômica. Por outro lado, um exemplo de classe nominal seria o substantivo 'cadeira', que designa móveis construídos para nos sentarmos. Esta definição é mera convenção e não está associada a nenhuma teoria científica sobre o universo.

Se pudermos acreditar que uma espécie pode ser definida por determinadas características, então, podemos considerar que espécies são classes de organismos. Este era a entendimento dos taxonomistas antigos. Nosso conhecimento atual das propriedades das espécies, contudo, mostra-nos que isto não é verdade, visto que espécies são mutáveis no tempo e no espaço. Assim, elas podem ser reconhecidas por um conjunto diagnóstico de características apenas num determinado momento e em um determinado local, não podendo ser definidas de forma definitiva por esse mesmo conjunto de características ao longo do tempo e do espaço.

Espécies como conjuntos: Enquanto classes são definidas pelas características ou propriedades de seus membros, conjuntos são definidos pelos seus membros, ou seja, um conjunto é uma entidade composta e definida pelos elementos que ela contém. Os membros é que definem o conjunto. Tomemos como exemplo, o conjunto dos passageiros de uma determinada linha de ônibus urbano; o que define este conjunto são os passageiros. Note-se que a cada nova viagem, o conjunto muda, porque mudam os seus membros. Ou seja, na realidade, temos uma sequência temporal de conjuntos de passageiros daquela linha de ônibus, um conjunto para cada viagem de cada veículo que atende à linha. Da mesma forma, é difícil considerar uma espécie como um conjunto, porque não se espera que a espécie deixe de ser o que era, à medida que novos indivíduos nasçam e outros morram; espera-se que espécies persistam ao longo do tempo...

Espécies como indivíduos: Indivíduos são entidades que se justificam por sua própria existência, independente de outras entidades semelhantes. Podemos tomar, como exemplo, um ser humano qualquer: ele terá um nascimento, uma existência e, finalmente, morrerá. É interessante notar que: a) a existência do indivíduo é independente da existência de qualquer outro indivíduo em particular; e b) ao longo de sua existência, o indivíduo pode mudar física e mentalmente, sem, no entanto, perder sua identidade. Espécies se encaixam perfeitamente neste modelo: elas nascem (em um processo de especiação); tem um período de existência (ao longo do qual podem mudar sem, no entanto, perderem sua identidade – anagênese) e, finalmente, morrem (extinguem-se). Elas podem ser reconhecidas num dado momento, mas não podem ser definidas de forma definitiva e absoluta, já que suas características são mutáveis temporal e espacialmente.

 

CONCEITOS DE ESPÉCIE

Embora as espécies, na natureza (e, potencialmente, os táxons que as representam em nossas classificações), sejam 'indivíduos', os conceitos de espécie normalmente são conceitos de 'classes': consideramos (ou esperamos) que as espécies sejam classes de organismos que apresentem propriedades bem definidas, pelas quais elas podem ser reconhecidas.

Podemos imaginar que nossos ancestrais humanos mais remotos já eram capazes de reconhecer diferentes tipos de animais e plantas no ambiente que os rodeava (veja mais sobre isto, aqui). Certamente, muitos desses tipos corresponderiam às espécies que a sistemática reconhece hoje. Podemos imaginar, também, que esses tipos só fossem distinguidos uns dos outros na medida em que apresentassem diferenças de alguma forma relevantes para a vida dessas pessoas. Assim, muitas espécies de invertebrados suficientemente desimportantes e/ou parecidas poderiam ser tratadas como uma única entidade (ou serem completamente ignoradas). De certa forma, é assim que as coisas continuam a funcionar fora da comunidade científica: quantas das dezenas de espécies de moscas existentes em um parque urbano são reconhecidas pelo não-taxonomista? É claro, também, que nossos ancestrais não deviam se preocupar com a natureza desses tipos; nos ambientes geograficamente limitados explorados por uma tribo, as espécies poderiam perfeitamente ser definidas como classes, com base em características mais ou menos constantes, naquela região específica. Desta forma, não é de se estranhar que a taxonomia, quando buscou definir o que fossem espécies, tenha partido de conceitos de espécies como classes.

Em seguida, trataremos de alguns dos muitos conceitos enunciados para as espécies, com ênfase naqueles que tiveram maior relevância histórica ou que possuem maior relevância para a sistemática filogenética. Muitos dos conceitos não discutidos abaixo são total ou parcialmente coincidentes no seu significado, com aqueles aqui apresentados.

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Conceito tipológico/morfológico: Embora os filósofos clássicos provavelmente não considerassem espécies nem imutáveis, nem precisamente delimitadas (Simpson, 1961), o conceito de espécies vigente à época de Lineu era derivado de ideias expressas por Platão e Aristóteles. São formulações básicas desse corpo filosófico: a) que todos os fenômenos materiais sejam representações imperfeitas de um mundo imutável de "Ideias" – o mundo ideal; e b) que cada entidade física possua dois tipos de características: sua essência e seus acidentes. A essência de um organismo ou grupo de organismos seria o conjunto de características que ele possui no mundo das ideias e expressariam sua forma perfeita; os acidentes seriam imperfeições oriundas do processo de reprodução da ideia no mundo real. Sem seus caracteres acidentais, a entidade continua a ser ela mesma; sem seus caracteres essenciais a entidade perde sua identidade. Dessa forma, toda espécie teria um padrão invariável (sua essência ou tipo), compartilhado por todos os membros do grupo. Segundo esta definição essencialista, as espécies se enquadrariam perfeitamente na definição filosófica de classes, podendo ser definidas pelas propriedades imutáveis (a essência) de seus elementos.

Neste contexto, as espécies não teriam nenhuma conexão especial entre si, seriam apenas manifestações de diferentes ideias e a variação entre indivíduos de uma mesma espécie representaria somente defeitos na reprodução dessas ideias. A delimitação dessas espécies “tipológicas” era um exercício inteiramente subjetivo, feito no mais das vezes sem nenhuma conexão com observações de cunho biológico. Espécies eram, em última análise, o que os taxonomistas reconheciam como tal.

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Com o entendimento mais amplo da evolução e com o avanço dos estudos ecológicos e genéticos, a natureza variável das espécies no espaço e no tempo se tornou óbvia. A variação passou a ser entendida como decorrência de processos genéticos (mutação, recombinação) e como matéria prima da evolução; a variação passa a ser entendida, então, como uma característica própria das espécies. Com este entendimento, a delimitação das espécies tornou-se muito mais complicada: Até onde vai a variação intraespecífica (dentro de cada espécie) e onde começa a variação interespecífica (entre as diferentes espécies)?

As espécies, como definidas pela taxonomia tipológica, passaram a ser consideradas como grupos artificiais, construídos apenas para a conveniência de nossas classificações. A ideia de que as espécies reconhecidas pela taxonomia deveriam representar entidades com existência real na natureza (táxons naturais), que poderiam ser estudadas objetivamente criou a demanda por um novo conceito de espécies. A busca por este novo conceito tem envolvido duas questões principais:

Questão conceitual: o conceito deve ser capaz de definir entidades biológica e evolutivamente relevantes e deve ser amplamente aplicável aos seres vivos; e

Questão operacional: deve ser possível reconhecer tais entidades na natureza para que elas possam ser associadas a um nome na categoria de espécie em nossa classificação e, desta forma, possam ser estudadas, manejadas e conservadas.

É necessário considerar que é possível que, em determinados casos, espécies cuja identidade é plenamente justificada biológica e evolutivamente possam não ser facilmente reconhecíveis, basta lembrar os inúmeros exemplos na literatura de complexos de espécies crípticas*. Neste caso, parece improvável que consigamos um conceito de larga aplicação que satisfaça, ao mesmo tempo, nossas expectativas teóricas e operacionais. Por outro lado, se queremos tratar de entidades que tenham existência real na natureza, o fato de sermos capazes de reconhecer prontamente toda e qualquer espécie parece irrelevante, afinal, a evolução na ocorre para satisfazer nossas conveniências. Assim, um conceito satisfatório do ponto de vista teórico deveria ter precedência sobre um conceito operacionalmente prático. Por isto, não nos preocuparemos em examinar as limitações operacionais dos conceitos apresentados abaixo.

O primeiro conceito de espécie a ser formulado no período pós-darwiniano (e, até hoje, o mais popular dos conceitos de espécie) foi o conceito biológico:

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Conceito biológico (Dobzansky): Embora já não seja mais tão bem aceito dentro da sistemática, o conceito biológico continua sendo o mais popular dos conceitos de espécie. Segundo ele, espécies seriam grupos naturais de populações de organismos capazes de cruzarem entre si, produzindo descendentes férteis, e que são reprodutivamente isolados de outros grupos equivalentes.

Duas limitações principais do conceito biológico vêm diminuindo sua aceitação:

Amplitude de aplicação: o conceito biológico é aplicável apenas a espécies sexuadas; e não se aplica, também, a espécies originadas pela hibridização de indivíduos de espécies ancestrais distintas;

Desconsideração da dimensão temporal: “espécies biológicas” são cortes temporais de linhagens constituídas por gerações que se sucedem no tempo. Populações separadas no tempo não podem pertencer à mesma “espécie biológica”, porque organismos de gerações distantes no tempo não podem cruzar entre si. (Homo erectus e H. sapiens seriam, mesmo, espécies distintas?)

Outro ponto que tem sido motivo de crítica a este conceito é o seu critério fundamental para distinção entre espécies, o isolamento reprodutivo. Considerando que a maioria dos eventos de especiação ocorre em alopatria*, o isolamento reprodutivo intrínseco não é uma condição necessária para que o tecido de relações tocogenéticas de uma espécie se rasgue em duas ou mais linhagens evolutivamente distintas. De fato, deveríamos esperar que mecanismos intrínsecos de isolamento reprodutivo só evoluam quando duas espécies muito próximas, originalmente alopátricas*, voltam a se encontrar no espaço geográfico (parapatria* ou simpatria*). Somente a partir daí, haveria pressão seletiva favorecendo a evolução desses mecanismos.

Defensores do conceito biológico consideram que as espécies representam o primeiro nível de descontinuidade na diversidade da vida, acima dos indivíduos. Entretanto, esta descontinuidade ocorre apenas quando se faz um 'corte' no tempo e ela é tão maior quanto maior for o tempo de divergência entre duas linhagens. Como a evolução ocorre continuamente, as linhagens estão sempre sofrendo algum grau de divergência e o estabelecimento de quanta divergência é suficiente para separar duas espécies parece ser uma tarefa impossível.

Para minorar este problema, foi proposto o conceito de subespécie. Subespécies seriam “espécies incipientes”, que ainda não teriam completado seu processo de diferenciação. Aqui cabe a pergunta: O que vem primeiro, a especiação ou a diferenciação?

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Conceito filogenético: Originalmente, o conceito filogenético caracterizava a espécie como um grupo monofilético e diz que a espécie seria um conjunto de indivíduos geograficamente restritos e que compartilham pelo menos uma sinapomorfia. Esta definição traz alguns problemas: 1) Excluímos de seu escopo, as espécies ancestrais, que seriam parafiléticas em relação às suas espécies descendentes, e das quais se distinguiriam apenas pela retenção de plesiomorfias; 2) Linhagens evolutivamente independentes só poderiam ser consideradas espécies a partir do momento em que adquirissem uma apomorfia reconhecível e, desta forma, duas espécies irmãs com diferentes taxas de evolução teriam idades diferentes; 3) Numa espécie polimórfica, dois irmãos que compartilhem uma sinapomorfia exclusiva devem ser considerados uma espécie à parte?

Outra formulação mais recente do mesmo conceito - 'espécies seriam os menores grupos que se poderia diagnosticar por um conjunto único de caracteres' - contém essencialmente as mesmas deficiências da versão original. Note que este conceito tem uma forte preocupação com o aspecto operacional: para que um conjunto de populações constitua uma espécie, é preciso que nós sejamos capazes de diferenciá-lo de outros conjuntos semelhantes.

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Conceito evolutivo (Simpson): O conceito evolutivo de espécies foi o primeiro a incorporar a dimensão temporal à definição de espécie. Segundo ele, a espécie seria uma linhagem de populações ancestrais-descendentes que mantêm sua identidade em relação a outras linhagens e que possui suas próprias tendências evolutivas e destino histórico.

Manutenção de identidade, aqui, significa que duas ou mais espécies evolutivas não se mesclam através de relações tocogenéticas frequentes e continuadas. É a manutenção desta coesão tocogenética que impede o fluxo gênico em níveis evolutivamente significativos, garantindo a manutenção de tendências evolutivas próprias de cada linhagem (novidades evolutivas surgidas em uma espécie evolutiva não são compartilhadas com outras espécies evolutivas). Note, contudo, que a manutenção desta identidade não é quebrada por hibridizações esporádicas entre indivíduos de espécies próximas.

Aqui, não é um conjunto de características que define a espécie, mas o fato dela ter um início no tempo (o evento de especiação no qual ela se originou), uma existência (enquanto a espécie sobrevive) e, eventualmente, um fim (a extinção). O isolamento reprodutivo intrínseco deixa de ser, por si só, condição imprescindível para o reconhecimento de espécies – o importante não é se indivíduos de dois grupos de populações são capazes de produzir híbridos férteis, mas se esses grupos, no caso de se encontrarem no espaço geográfico, manterão suas individualidades e histórias evolutivas próprias ou se eles voltarão a se fundir em uma única entidade evolutiva. Desta forma, a eventual transferência horizontal (lateral) de genes ou a origem de novas espécies por hibridização de espécies ancestrais não são empecilhos ao conceito de espécie evolutiva.

O conceito evolutivo de espécies não exclui nenhum processo evolutivo ou modo de especiação e, portanto, pode ser aplicado universalmente ao mundo biológico. É importante notar, ainda, que as espécies em qualquer grupo taxonômico, na perspectiva do conceito evolutivo, são entidades equivalentes e comparáveis: Todas elas constituem entidades originadas em eventos de especiação, dentro das quais as interações tocogenéticas prevalecem sobre as interações filogenéticas.

Neste site, a não ser quando especificado em contrário, consideramos as espécies segundo este conceito evolutivo.

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Vocabulário

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  • Alopatria: situação daqueles organismos que vivem em espaços geográficos separados (por exemplo: dois continentes separados por um oceano; duas regiões separadas por um grande rio ou cadeia de montanha; dois ecossistemas de floresta tropical úmida, separados por um ecossistema semidesértico).

  • Clado: grupo monofilético (do grego klados = ramo). (Mais informações sobre clados, aqui)

  • Espécies crípticas: conjuntos de espécies morfologicamente indistinguíveis ou que se podem distinguir apenas com base no exame minucioso de caracteres sutis ou caracteres comportamentais e/ou moleculares. Normalmente, atribui-se essa semelhança extrema ao fato de que essas espécies teriam se originado muito recentemente, a partir de um ancestral comum. De fato, dependendo de como se define espécie, pode-se admitir que durante algum tempo após o evento de cladogênese, duas espécies sejam absolutamente idênticas, até que o processo de diferenciação comece a ocorrer.

  • Isolamento reprodutivo: a incapacidade de indivíduos de populações distintas se acasalarem, produzindo descendentes férteis. Esta incapacidade decorre de mecanismos intrínsecos ou extrínsecos de isolamento*.

  • Mecanismo de isolamento reprodutivo: Qualquer fator que impeça que indivíduos de duas populações produzam descendentes férteis, por meio de reprodução sexuada. Esses mecanismos podem ser intrínsecos (quando são inerentes aos próprios indivíduos, gerando incompatibilidade genética, fisiológica e/ou comportamental) ou extrínsecos (quando se devem a fatores externos ao indivíduo, como o isolamento por barreira geográfica ou ambiental).

  • Parapatria: situação daqueles organismos que vivem em espaços geográficos contíguos. Neste caso, embora não apresente nenhuma barreira evidente à migração, as populações não se sobrepõem de fato no espaço.

  • Reticulado: estrutura organizada como uma rede, com elementos entrecruzados (no caso das relações entre espécies, o termo é utilizado quando uma espécie se origina do cruzamento de indivíduos de duas espécies ancestrais distintas. Neste caso, na representação gráfica das relações entre essas espécies, há formação de 'células' fechadas entre os ramos da filogenia, devido a essa hibridização, como mostrado na figura abaixo:​

  • Simpatria: situação daqueles organismos que vivem em um mesmo espaço geográfico, de tal forma que eles possam se encontrar ao longo de sua existência.

 

Bibliografia

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  • Simpson, G. G. 1961Principles of Animal Taxonomy. New York, Columbia University.

  • Wille, H. 1966. Phylogentic Systematics. Urbana, University of Illinois.

  • Wiley, E. O. & Lieberman, B. S. 2011. Phylogenetics –Theory and Practic of Phylogenetic Systematics. Hoboken, John Wiley & sons.

Este tema continua em:
"homologia na sistemática"
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